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Nem todo suicídio é um execrável ato, muitas vezes é uma ação de
coragem. Processo doloroso onde o auto julgamento leva por punição a pena de morte, sendo uma só pessoa a criminosa, a julgadora, defesa,
o júri e seu carrasco executor da pena.
E sabe o que é mais curioso disso tudo? Há uma
infinidade de pessoas habitando a Terra que estão mortas sem coragem de cometer
o haraquiri.
Óbvio que não falo da morte física, mas da maior de todas as
mortes: a da alma. Mas como poucos prestam atenção em sua existência, as pessoas
andam por aí com corpos enxutos carregando um cadáver dentro, concomitante com
a nova essência que briga por um lugar nesse “latifúndio”. A nova
essência tenta expulsar esse corpo estranho, inerte putrefato.
Esse conflito, essa catarse faz com que muitas vezes tenhamos
atitudes esquisitas, incompatíveis com nosso cerne. Tantas pessoas
irreconhecíveis fazendo uma espécie de exocitose, se deformando para expurgar
esse corpo estranho.
Confesso que me vi assim, me olhando no espelho e não
reconhecendo o reflexo, nem algumas atitudes. Olhava para os lados e não
reconhecia ninguém. Amigos não eram mais amigos, afinidades não existiam mais
entre tantos que antes eram de grande enlace. Atividades, valores, lugares,
gostos, roupas, quadros, músicas. Parei tudo. Fui ver onde estava me perdendo.
Yoga, reiki, meditação, conversas, gritos, silêncios. Parei tudo. Uma grande
briga se travou dentro de mim. Uma faxina geral, uma reforma estrutural,
processo de retirar aquele defunto que me habitava. E lidar com o luto e desapego
de ser grata e deixar ir o que já não mais sou.
Percebi a bagunça que faz ser surdo da própria existência. As
mudanças aconteceram paulatinamente, a pobre alma tentou avisar que estava mudando, mas eu
continuava certa das verdades que construí desde criança, achando que era dona
de mim. Mas, não vi que esse “eu” era o ego surdo, tendencioso e mentiroso
que deixei reinar por muito tempo sem dar um limite. Acabou crescendo igual
criança mimada, ignorante e raso por essência. Arrogante e prepotente que não
pede ajuda, nem conselho, que sai por aí igual “cavalo xucro” dando “coice” e se
machucando. Pior: machucando pessoas no caminho. E o mais curioso, percebi que
desse rebanho que fiz parte por uns bons meses, tem muita gente que conheço e
ele só aumenta.
Creio que essa epidemia de suicídios e depressão são oriundas
desta mesma matriz. Ouça você mesmo, mude de religião, vire vegetariana, deixe de
ser vegetariana, vire ateu, seja lá o que for, aceite escute e aceite o que sua
alma “fala”.
Muitos por vergonha, outros tantos por ignorância ou extremo
apego andam por aí sendo “múmias” de si mesmos. O mais curioso é que todos em volta percebem que
vivemos como avatares. Creio que meu maior erro foi, pior do que não me ouvir,
foi escutar os outros. Todos cheios de opiniões e julgamentos sem de verdade se
preocuparem em fazer com que eu me escutasse. Não é de hoje que dizem que o erro
é uma escola, mas eu diria que os momentos de queda são como máquina de lavar: sacode tudo, lava,
tira a sujeira, te limpa e te devolve todo amassado, mas leve e perfumado. Tira
os falsos amigos, perdoa-te os erros, organiza os pensamentos, devolve-te novinho para
novas lições, para se sujar de novo e começar o novo ano letivo nessa escola
sem fim.
Só sei que consegui enterrar meu cadáver com honras e pompas,
eternamente grata pelo que fui e feliz com a criança serelepe que está
crescendo em mim. Nada de dramas ou ressaca moral. Tenho pedidos de perdão para
quem magoei, devo, principalmente desculpas à minha jovem nova alma que por meses deixei dormir no relento. Mas, agora está
tudo certo, ela está aqui dentro de mim protegida e bem alimentada e sapeca
pulando poças, descalça.
Quanto a você, vasculhe seu terreno e veja se não tem nenhuma parte morta
que anda “fedendo” por aí. Enterre, torne-a adubo e vai cultivar teus novos
sonhos. Da mesma forma como tirar cutícula, cortar unhas, cabelos, a alma também carrega
uma parte morta. Assim como erva daninha, deve ser podada. Não seja um cadáver
ambulante, não seja um blefe. Na verdade é libertador e muito fortalecedor ser
eu de cujus de mim mesma.