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Ontem foi aniversário de uma
amiga. Menina de alma doce, compositora talentosíssima e com uma capacidade de
empatia ímpar. Ela leu algumas mensagens de felicitações. Dentre elas, uma me
chamou a atenção. Desejava felicidades, amor, saúde e também que mantivesse a
tristeza latente em sua alma, para que ela pudesse continuar escrevendo lindas
canções, porque a beleza das letras está
na dor pungente.
Olhei para a aniversariante com
ares de resignação, porque é a mais pura verdade. Eu escrevo quando dói. Me senti humana nessa hora (sim, têm dias que
me ponho acima dos deuses do Olimpo). Também desejei (em silêncio) a dor a ela,
e a mim.
Lembrei que não escrevo há
tempos. Não que esteja sem dores, só acho que me anestesiei. Dor que não se sente, não se tem. Voltei pra casa derrotada, como um vencedor
mundial de MMA que usou drogas e burlou o antidoping. Dores íntimas e silenciosas,
quando descobertas, ardem mais.
Passei o dia a cutucar as feridas
da minha alma. Raspei saudades, tirei a casca das escolhas mal feitas, passei
álcool nos cortes que me mutilei por derrotas não digeridas. Despi as indulgências
e fiquei nua com a pele lanhada. Enchi a banheira de sal e mergulhei. Senti cada
ardência dos machucados que aceitei de presente da vida. E agradeci por sentir
a dor de estar viva.
Esse texto de tom pesado, aos
olhos de um poeta, soa brisa. E para um bom intérprete de alma, sabe que é aí
que mora a felicidade. Em aceitar a incompletude da vida, os desencontros, as
esperas, os becos sem saída que nos ensinam a pular o muro.
Tem uma música que diz “eu não
consigo ser alegre o tempo inteiro”. Pois é, eu também não consigo, e nem
quero. Quero a distância e
a chegada. Mais que sorrisos francos,
quero o choro sincero. Enquanto as pessoas têm medo de chorar, eu tenho gana
por viver. Mal sabem elas que as lágrimas lavam a alma para a alegria fazer
morada.
As pessoas fogem desenfreadamente
da dor. Bebem, cheiram, têm relacionamentos fugazes, se escondem e vivem como
múmias sem sentir o real gosto de estar vivo.
A felicidade vem para aqueles que
ousam sentir a derrota, que colocam os joelhos no chão não apenas por devoção, mas
por serem alunos da escola dos tombos e tropeços. Aliás, quero ser laureada nesse
liceu, porque cada tombo ensina a se levantar e cair com mais suavidade, até chegar
o dia em que perdemos o medo de beijar o chão.
A felicidade é um milagre para
poucos que ousam ir além da reles superficialidade dos lugares comuns, dos
sentimentos comuns, do relacionamento meia boca, do sorriso que não mostra os
dentes, do rolo compressor da rotina
esmagadora de sonhos.
Eu quero mais, eu bebo a vida aos
goles. Prefiro ter a língua queimada do que comer a vida pelas beiradas. Eu quero mesmo é me doer (e me doar) inteira, afinal a dor é a pimenta da vida.
Para Indy, que sempre leva minha
dor para dançar.
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