Na época da ditadura, o
cronista Tarso de Castro publicou uma coluna totalmente em branco na Folha, em protesto
contra a prisão do jornalista Lourenço Diaféria, e foi retaliado também por não
escrever nada. Ou seja, censuravam até uma página em branco.
Soube disso na aula de
história e me marcou a ironia que envolve esse contexto. Hoje me peguei
pensando nisso. Nos textos em branco que publico diariamente na minha vida.
Quase todos os dias
acontece algo que eu penso “deveria escrever sobre isso”, mas me auto-censuro.
Não quero encher minha
vida da vazios, coisa que muita gente faz. E agora falo em terceira pessoa,
porque no mundo tem muita gente cheia de páginas em branco, publicadas nos
principais cadernos que compõem suas vidas.
Oscar Wilde dizia que
viver é a coisa mais rara no mundo, porque a maioria das pessoas apenas existe.
Eu me considero borderline, estou na corda bamba entre viver e existir. Quero e
tento viver intensamente, mas por vezes existir apenas é tão mais brando, calmo
e seguro... Viver exige coragem, força e resiliência.
E assim fui alternando meu livro entre páginas
cheias de cor e outras pálidas, sem viço. Mas a mim, como uma boa leitora, jamais agradaria ler um livro com falhas, com histórias pela metade, sem nuances
que instigam meu pensar, meu olhar, meu viver.
Muitos leitores meus
deixaram de ler o blog porque não havia mais nada de novo escrito, muitas
pessoas deixaram de habitar minha vida porque me auto-censurei pra elas. Pelo
meu eterno silêncio. Não que seja ruim, a vida é assim. Ninguém entra ou
permanece na nossa vida por acaso.
Estou escrevendo
justamente por isso, porque não quero ser um livro pela metade, quero encher
meus dias de cores, mesmo que por vezes essas cores sejam preto e branco, quero
ter nele páginas perfumadas, páginas com reticências, mas com uma bela
história, com personagens reais, humanos e com brilho no olhar. Do jeito que eu
gosto de viver e ter por perto.
Uma pessoa me ensinou a
abrir meu caderninho e escrever diariamente textos multicoloridos, com direito
a desenhos e aromas. Com ela aprendi que nenhum sonho, nenhum sentimento ou
desejo deve ser censurado. Essa pessoa me ensinou a viver.
Porque, como está
escrito no meu poema preferido, mesmo com toda a tragédia, sofrimentos e sonhos
desfeitos, o mundo ainda é belo.