terça-feira, 15 de julho de 2008

O Tempo de Cada Um

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Andei um tempo sem vontade de escrever, com várias idéias, mas sem algo que me puxasse para essa cadeira. E o livro que estou lendo é tão bom que troco facilmente pelo teclado, mas aconteceu algo que tocou e me fez pensar muito. Tem correlação com meu último texto e fala também sobre as fases da vida.

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O Tempo de Cada  Um 



   Às vezes quando estou no centro da cidade vendo as pessoas correndo para todos os lados, paro por alguns segundos e penso: vários mundos se cruzando, cada um preocupado com o que marca em seu relógio, mantendo seu compasso agindo reativamente sem questionamentos, apenas se defendendo do que os ameaça. Cada um na fase que marca seu calendário, e elas podem ser muitas.

 Uma comum é a dos idosos recém separados ou viúvos que vivem uma divertida segunda juventude. Por outro lado, tem também aquela de algumas pessoas de 25, carrancudas que levam a vida fosse um fardo que carregam há muitos anos. Existe a fase dos desesperados, em que se quer viver loucamente, arriscando sem pensar nas consequências. Vivem em euforia, mas geralmente carregam um grande vazio. Essas pessoas estão tentando descobrir algo que supra o eco que têm dentro de si. Se não saem dessa fase até os 20 anos, podem ficar fadadas a viverem nela para sempre em codependência  a algo ou alguém que sirva de bengala.

   Por outro lado, têm aqueles que estão em uma fase ímpar, no sentido de sem par, sem busca, apenas no admirável zelo de encontrar-se. Uma proteção exacerbada mas que se faz necessária, no mínimo, uma vez na vida. As pessoas que estão nessa fase não são felizes nem tristes, mas se sentem no lucro por não terem algo que lhes possa trazer decepção. Sem aquela agitação existencial de buscar algo. Geralmente estão protegidas no seu exoesqueleto passando por um período de reflexão, de mudança de conceitos ou valores, de bases.  Estão se reconstruindo e, enquanto não estão prontos, formam uma “casca” externa para poderem trabalhar em paz em sua empreitada solitária. 

Quem olha desatentamente de fora não nota nenhuma diferença, mas por dentro ela se recria. Isso só acontece com quem tem muito sentimento dentro de si, pessoas intensas e sinceras, por isso sofrem mais quando há decepções, sendo suscetíveis a se tornarem céticas. São pessoas órfãs de algo em que depositar sua fé. Essas só voltarão a ter o verdadeiro brilho quando seus olhos mirarem algo que seja digno da sua lealdade e confiança a quem possam entregar os sentimentos e as façam novamente ternas.  
                                                                                                                         

   Todos que cruzamos estão em um momento único. A vida está cheia de (des)encontros assim, quando se fundem duas vidas, cada uma com um calendário diferente, com uma estação definida, muitas vezes contrárias... um está em pleno verão, outro hibernando em um rigoroso inverno. Por mais doloroso que possa parecer, é preciso respeitar o tempo de cada um. As massas de ar vão se encontrar, vai acontecer a tempestade. Nada fica como antes, mas essa agitação é parte da engrenagem que move a existência. A nossa vida precisa passar por tempestades para, enfim, encontrar a calmaria.





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3 comentários:

Anônimo disse...

Bah Fabri!

Que belo texto!

Que sensibilidade para com os tipos humanos!

Parabéns pela amplitude de visão, pela profundidade, pela poesia a salvar os dias...

Bjo do teu amigo,

Rodrigo Tejada

RenataSF disse...

Fabrine....
Lindo teu texto!
Fazia um tempo que não lia algo tão bom e bem escrito.... Muito bom!!
Parabéns nega!!
Beijão!

Anônimo disse...

fase ímpar...descreveu meu atual momento, faltou falar que essa fase, apesar de aparentemente serena, angustia um pouco também..pq há a pressão pelo par, que sempre devemos estar buscando algo e essa pressão acaba por vezes interiorizada fazendo com que deixamos um pouco de aproveitar esse momento, essa fase que pode ser tão reveladora.
saudade
beijos